Francisco Oliveira, o Presidente da
Junta de Freguesia da Luz, concelho de Mourão, desabafava na passada semana à
comunicação social que a nova Aldeia da Luz parece uma aldeia fantasma, em
consequência do não cumprimento das promessas feitas pelos governos e pela EDIA,
a troco da mudança de residência dos seus habitantes.
A nova Aldeia da Luz contabiliza
agora o seu 10º aniversário e tive oportunidade de, no âmbito das comemorações
do mesmo, ouvir em pormenor as insatisfações expressas pelo Presidente da Junta
da Luz, quanto às dificuldades da mesma e dos habitantes da aldeia em disporem integralmente
do património habitacional, em construírem novas habitações ou alargarem as
existentes, em promoverem a atividade agrícola, em recuperarem infra-estruturas
coletivas de apoio à produção, …
Visto ao longe, pode parecer apenas
mais uma lamúria de queixumes autárquicos, típicos do nosso quotidiano rural,
mas, assistir na própria aldeia ao filme da mudança da submersa para a nova
Aldeia da Luz, faz-nos perceber com outros olhos a carga emocional de um
processo social que poucos em Portugal e mesmo no mundo experimentaram e o
quanto aquela comunidade sofreu na sua identidade e organização interna. Arrepiante
…
No entanto, fizeram-no, abdicaram de
tudo o que sentiam como seu, individual e coletivamente e mudaram-se para uma
aldeia totalmente nova, na qual não dispõem ainda, passados 10 anos, de algumas
condições fundamentais para estabilizarem o processo de reconstrução
identitária, motor essencial na construção e reinvenção de dinâmicas que
contrariem a pressão desertificadora que assola todo o interior do país e do
Alentejo em particular.
E é aqui que radica a minha
incompreensão, perante insensibilidades anteriormente verificadas de poderes
distantes a esta comunidade, face às especificidades do processo, único entre
nós e que, por isso mesmo, mereceria muito maior atenção e respeito pelas
pessoas que o viveram e que o conduziram.
Ocorreu de forma ordeira e com o
sucesso conhecido, com o protagonismo de Francisco Oliveira, um autarca que
termina agora a sua passagem pela Junta de Freguesia da Luz com a bem sucedida
experiência que nenhum outro tem em Portugal e poucos terão no resto do mundo:
a mudança de vivos e mortos para um novo local e a submersão do antigo, pelo
grande lago de Alqueva.
É obra, digna de merecido
reconhecimento público, mas o qual não se vê acontecer, nem mesmo na discussão
em curso sobre a reorganização autárquica, nomeadamente no que toca à
importância das freguesias rurais enquanto elementos estruturantes do poder
local. Não existirá maior evidência da importância do papel de uma Junta de
Freguesia e do seu Presidente, na condução da mudança, do que aquele que
aconteceu na Aldeia da Luz, concelho de Mourão, Alentejo. E a Junta de
Freguesia da Luz, um caso exemplar do exercício autárquico, continuará a
existir.