2008-08-08

PELA ELEVAÇÃO DO NÍVEL - DESTAQUE DE UMA BOA INICIATIVA DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

A iniciativa do Ministério da Educação de atribuir prémios aos melhores alunos do ensino secundário merece um louvor público, pelo facto de representar um estímulo e afirmar uma atitude contrária (e no bom caminho) ao descalabro que tem vindo a constituir o elogio da mediocridade protagonizado pelos governos socialistas mais recentes, cada vez mais premiadores das até agora não publicitadas oportunidades de contorno do esforço para a obtenção de um qualquer titulo, ainda de possa este ser desprovido das competências que a ele deveriam estar associadas.

A elevação da exigência, nomeadamente no ensino secundário, poderá constituir um estímulo, que cada vez mais merece prémio no deserto do laxismo reinante, contributivo para estimular os jovens a procurarem destacar-se daquilo que é o padrão reinante do ensino português: o facilitismo, o desprezo do trabalho e do esforço, o nivelamente por baixo e, mais tarde na vida profissional, a inveja e a procura de "fechar portas" aos que se destacam, como se de uma "anormalidade sofressem".

O sempre atento O Jumento não deixou passar em vão a discussão sobre as ruas da amargura em que o mérito cada vez está mais afogado, e de dar um coice certeiro na cretinice dos supostos "normais" críticos da medida, vá-se lá saber porquê? Quem tem confiança em si e adquiriu espírito competitivo para dar sempre o melhor que pode, não tem medo de se por à prova.

Ainda alguém ousa perguntar se deve "O mérito deve ser premiado?"

Será uma graçola? Ou será mais uma infeliz banalidade e já não parece envergonhar os mediocres que alguém num país supostamente desenvolvido e moderno faça perguntas que desvalorizem o mérito em benefício sabe-se lá do quê? Eis uma razão constributiva em algum grau para que vários estudos sociológicos em Portugal continuem a destacar crescentemente o factor "cunha" entre os principais mecanismos mobilizados na procura de emprego ... e não só.

Poderemos chamar a isto um país a sério? Sim, porque esta é a nossa matriz cultural, estruturada ao longo de muitos séculos, claramente identificada na década de 1970 e que não muda facilmente, antes se mantendo bastante pujante em presença nas várias áreas e domínios da sociedade portuguesa, desde a política à economia, consubstanciada nos correntes dítames populares do "quem vier atrás que feche a porta" ou no "quem parte e reparte e não fica com a melhor parte ...", ou ainda "não importa saber, mas ter o número de telefone de quem sabe", ou ainda o cada um "desenrrasca-se como pode".

Do ponto de vista da ética e do respeito pela competição clara e regrada, aprendi, nos meus tempos de escola primária em Vila Viçosa, onde alegadamente concebido cresci desde tenros meses e estudei até ao final do secundário, o valor do esforço individual, sem passar por cima de ninguém e mobilizando apenas os recursos próprios, em benefício da conquista de um lugar cimeiro.

Esses valores, adquiridos no ensino básico primário, fundamentais, no estímulo da mobilização dos recursos em benefício da conquista pelo mérito, nunca mais se esquecem e guiam-nos ao longo da vida por caminhos de ambição que os covardes e os incompetentes, incapazes de nos enfrentarem com os seus (exíguos) recursos de raciocínio, não compreendem e que tentam contronar pela malícia, pela traição, pela intriga, pela inveja, pelo boato, por todos os meios que lhes compensem nivelar pelo seu baixo nível a elevação a que nunca chegariam por meios próprios.

Os meios políticos e partidários de nível intermédio, são um dos maiores focos destes sintomas, em consequência e como reflexo de uma matriz cultural que o sistema educativo reproduz, em consequência da hipócrita igualdade de acesso e sucesso de todos, cujo resultado, na vida prática, está longe de corresponder a tal fantasia, antes mobilizando as cunhas resultantes do capital social (incluindo as teias de relações com forte componente política) para compensar a ausência de esforço e de empenho pela meritocracia, que a aparência quotidiana ilude. Mas as empresas privadas e Administração Pública, bem como outras organizações, funcionam sob igual influência.

Voltando à minha escola primária de Vila Viçosa, que frequentava no 3º ano quando o 25 de Abril de 1974 ocorreu, recordo que o já malogrado e boa pessoa Prof. Martins dispunha a sala em 3 filas classificadas da esquerda para a direita como "campeões", "pimpões" e designação que por ser menosprezadora não refiro.

O professor não distribuía os alunos pelos lugares, antes este deveriam escolhê-los, mas, com regras. Cada aluno da turma tinha a sua posição, conquistada pelo seu esforço e reconhecida pelo mérito alcançado, sem batotas, sem cunhas, nem as vigarices que todos os os dias encontramos hoje por parte dos incompetentes e dos mandraços. Cada posição era válida apenas por uma semana.

A disputa conducente à repartição dos lugares da sala estava reservada às manhãs de sábado, dedicadas aos "combates" em que qualquer aluno poderia desafiar um outro colega, posicionado em lugar privilegiado face a ele, com vista a que, sob a égide do professor árbitro, devesse responder a perguntas relativas à matéria aprendida durante a semana transacta, a qual, se estudada e respondida adequadamente, resultava na manutenção do lugar do desafiado, ou, em caso contrário (e demonstrando o desfiador que a dominava), tinha como desfecho a troca de posições.

Lutar pelos lugares cimeiros e, especialmente, conservá-los perante os ataques dos ambiciosos conquistadores, obrigava a uma preparação constante de todos aqueles que se empenhavam por se preparar para fazer brilhar as suas competências e sentirem a recompensa do seu esforço.

O mérito era o único valor incontestado na sala, sempre presente mas nunca pronunciado porque disso não havia necessidade. A batota, a intriga e a cunha não existiam, apenas a transparência assegurada pelo professor árbitro que aplicava as regras que todos conheciam e que eram obrigados a respeitar.

Algumas pessoas a quem já contei esta passagem da minha formação escolar e pessoal procuram identificar as supostas brechas educativas na formação humana sujacente a um modelo educativo de uma esquerda hipocritamente igualitária, denunciando que os menos capacitados intelectualmente ou reiteradamente fracassados na sua procura por um lugar cimeiro, restam vulneráveis ao abandono escolar.

Aceito o argumento pela parte que possa ter de influência no resultado final, mas nunca deixei de vincar que nivelar por baixo ou pela medianidade riscando a palavra mérito e esforço em detrimento do facilitismo, não conduz a resultados mais satisfatórios, antes pelo contrário, faz baixar o nível geral que, no seu conjunto, perde capacidade de competição em contextos mais amplos. Porter tinha razão quando afirmava que só a competição interna nos torna mais fortes para disputarmos mercados com outros, em contextos mais amplos, a níveis mais complexos e exigentes.

Mas, a ausência de competição regrada (e de estímulo, seja ele monetário, de prestígio, ou outro), conduz ainda à procura, pelas via mais sinuosas, de formas de ultrapassagem dos que seguem o precurso transparente e regrado, o que, constituindo o germe da mediocridade, procura na cunha o que por mérito próprio desprezamos, a maior parte das vezes sem nunca termos sequer tentado. Tal representará certamente um total desperdicio de recursos pelo abandono da capacidade de mobilização de nós próprios e das nossas competências em prol de uma meta que sempre deveremos ter e periodicamente renovar e/ou substituir.

Nos vários domínios da nossa vida adulta, a competição não só é inevitável como é crescente e, sem regras na maior parte dos casos. Ora, quem não aprendeu os valores da justiça e da equidade, do respeito pela norma, da transparência da acção, na sua infância e juventude, não olhará a meios para atingir os fins em várias fases da sua vida. A política é, em Portugal, o mais fértil campo resultante do fracasso de um sistema educativo que não ensina a todos desde o início, o valor do mérito conquistado por iniciativa própria.

Mais ainda, é que a outra modalidade educativa de que vinha falando, formal, na escola primária de então, levou-me a enfrentar, pela via formal, transparente e frontal, os meus objectivos, as minhas metas e os que estão no caminho para os conseguir, que devo ultrapassar em vez de desviar do caminho.

Sem nunca fazer batota nem passar por cima de alguém, sem recurso à cunha mas sempre procurando apenas o mérito resultante do reconhecimento (objectivo e transparente) das capacidades, competências e desempenho alcançado, não podemos deixar de sentir orgulho e satisfação pelo facto de, quando tais circunstâncias garantidas, conseguir disputar as posições cimeiras dos momentos e contextos que nos envolvem. Dificuldade tenho sim com a batota e ausência de regras e escrúpulos da parte de outros para quem a honestidade nada representa.

Arrogância, chamam os incompetentes e medíocres a esta postura. Porquê? Por ser ousada e desconhecida para eles? Por sentirem medo e falta de coragem de enfrentarem quem devem, no momento certo, com medo de perderem com transparência? Não há que ter medo do insucesso temporário, apenas há que melhor as competências e a performance para conseguir os objectivos que nos propomos, pela via do esforço, empenho e ... o mérito será reconhecido, mesmo que não o consigamos uma ou outra vez, por acidente ou por distracção perante a trafulhice dos outros.

Nas Universidades onde estudei, com a mesma dedicação e esforço que aprendi na escola primária, com transparência e apenas dedicação, esforço e empenho, procurei sempre e consegui os lugares cimeiros, alguns deles recompensados monetariamente como o Prémio do benemérito ebonere Eugénio de Almeida atribuido pela Fundação com o mesmo nome aos alunos destacados em algumas áreas da Universidade de Évora.

Dele me orgulho por figurar no meu curricuclum vitae e recomendo a todos os alunos, em qualquer grau de ensino, desde logo em primeiro lugar aos meus filhos. Não fui comprara nenhuma consola de jogos com esse dinheiro, mas se um aluno do secundário de hoje o fizer, não deve ser condenado, porque mereceu fazer com esse prémio aquilo que considere mais adequado. Sem prémio, fará o mesmo com o dinheiro dos pais e, em muitos casos, sem o merecer, por ausência de esforço.

Continuo a acreditar que apenas o esforço próprio compensa ... e nos distingue, mais que não seja dos que não tentaram e que nunca saberão quanto valem por eles próprios.

Mas também começo a acalentar algum pessimismo, quando sinto crescer à volta dos honestos, a condenação pelos seus valores, como se desajustados estivessem já e os tivessem tornado em anormais seres num mundo cada vez mais selvagem e com mais ameaças quanto ao futuro.

Cabe também ao sistema educativo reduzir uma parte dos efeitos de tais ameaças.

Sem comentários: