Bastonário: Grupos restritos fazem negócios milhões ...(
O bastonário da Ordem dos Advogados disse hoje que se «fazem negócios de milhões com o Estado», cujo objecto são bens do património público, «quase sempre com o mesmo restrito conjunto e pessoas e grupos económicos privilegiados».
«Muitas pessoas que actuam em nome do Estado e cuja principal função seria acautelar os interesses públicos acabam mais tarde por trabalhar para as empresas ou grupos que beneficiaram com esses negócios», afirmou António Marinho Pinto no discurso de abertura do Ano Judicial, que decorre no Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa.
Na mesma linha das polémicas declarações proferidas sexta-feira e que levaram o Procurador-Geral da República a abrir um inquérito, o bastonário insistiu que «há pessoas que acumularam grandes patrimónios pessoais no exercício de funções públicas ou em simultâneo com actividades privadas, sem que nunca se soubesse a verdadeira origem do enriquecimento».
No entender de Marinho Pinto, todos estes factos provocam «um sentimento generalizado na sociedade portuguesa de que o sistema judicial é forte e severo com os fracos, e fraco, muito fraco e permissivo com os fortes». Há «uma criminalidade de colarinho branco que se pratica quase impunemente na sociedade portuguesa», disse.
Voltando à carga, Marinho Pinto refere que «nas empresas que prestam serviços públicos de grande relevância social, como nas comunicações postais, energias e telecomunicações, perdeu-se há muito o sentido de servir o público em benefício de estratégias que privilegiam vantagens para os accionistas».
Num retrato da sociedade portuguesa, o bastonário referiu também que «grande parte do país - pessoas e empresas - trabalha para os bancos que acumulam lucros tão escandalosos quanto os benefícios fiscais de que gozam».
Lembrou que, num «país de extremos» (ricos e pobres), os «titulares de alguns serviços e instituições públicas auferem, em Portugal (que é um dos países mais pobres da União Europeia) remunerações superiores às das suas congéneres de outros países bem mais ricos».
«Existe na sociedade portuguesa um sentimento generalizado de que a corrupção e o tráfico de influências - dois dos delitos que mais ferem o Estado de Direito - sem entranharam nas estruturas do Estado«, salientou. Observou que »não há uma obra pública, seja qual o seu valor, que seja paga, afinal, pelo preço que foi adjudicada«.
O bastonário considerou que a Assembleia da República »degrada-se com a insuportável teatralização e a falta de autenticidade dos seus debates públicos«.
Num discurso bastante crítico, Marinho Pinto afirmou, igualmente, que nunca se percebeu por que »é que a última lei da amnistia e perdão de penas perdoou parte das penas por crimes de abuso sexual de menores e já não o fez me relação a outros delitos bem menos graves«.
Numa alusão à reforma executiva, o bastonário criticou a privatização de sectores da Justiça »em que o Estado entregou a agentes privados a cobrança de dívidas resultantes de decisões dos tribunais, com nefastas consequências«.
«As dívidas já não se cobram nos tribunais, mas sim com recurso a empresas privadas ou então através de métodos criminosos», frisou, lembrando que «mais de uma dezena de pessoas, contabilizada em meados de 2007, cumpria penas de prisão por tentar cobrar dívidas à força».
Na sua intervenção, Marinho Pinto criticou ainda a desjudicialização da Justiça, o sistema de defesas oficiosas/apoio judiciário e o futuro mapa judiciário que, em seu entender, «concentrará a Justiça em grandes centros urbanos».
Diário Digital / Lusa
29-01-2008 16:24:00
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