- Não têm poupanças, não têm casa, não têm carro, não têm filhos
Apesar de não ter origem portuguesa, a expressão "mileurista" serve como uma luva a milhares de trintões nacionais.
Mas foi na vizinha Espanha que nasceu o termo com que se identifica toda uma geração residente nos países da Europa mais ocidental.
Tudo começou com uma carta que a jovem publicitária Carolina Algualcil, residente em Barcelona, dirigiu ao jornal espanhol "El Pais". O calendário marcava o ano de 2002 e o periódico não hesitou em publicar na íntegra a missiva que tinha por título "Sou mileurista". A carta foi o resultado da (in)digestão de uma passagem por Berlim, viagem onde Carolina Algualcil constatou as diferenças entre os estilos de vida e tabelas salariais que vigoravam entre companheiros de geração das duas cidades europeias.
Assim descrevia a jovem publicitária na sua carta as características dos "mileuristas" espanhóis. "Gastam mais de um terço do seu salário no arrendamento de casa. Não têm poupanças, não têm casa, não têm carro, não têm filhos, vivem o momento... Às vezes é divertido. Mas já cansa." É certo que este "modus vivendi" que parece permanecer eternamente em vésperas da idade adulta apesar do passar dos anos é determinado por um conjunto de factores para além da matemática financeira. Mas a magra conta bancária é uma forte ditadora nesta conjuntura. Os "mileuristas" estão longe do salário mínimo nacional mas também se posicionam muito aquém do conforto económico que as suas qualificações prometiam.
São uma nova classe social, ensinada a aproveitar o dia-a-dia e que não quer abdicar de uma certa qualidade de vida que aprendeu a usufruir em casa dos pais. Por isso, muitas vezes adiam a saída do lar paternal, desalentados pelo elevado valor de venda das casas e pelas exorbitantes quantias do arrendamento imobiliário. Adiam igualmente a chegada de filhos, meta considerada alcançável apenas depois de atingida alguma estabilidade económica que tarda em bater à porta. E de adiamento em adiamento, a juventude vai ficando para traz e o futuro dourado que as habilitações académicas prometiam nunca mais chega.
As características desta geração de infância afortunada e adolescência permanente explicam parte do fenómeno a que se somam factores como a precariedade laboral e o excesso de licenciados que o mercado de trabalho não consegue absorver.
E nem o mais longínquo futuro lhes sorri, numa altura em que se multiplicam as vozes que alertam sobre a falência do Estado Providência e a possibilidade da geração hoje pelos trinta anos poder vir a não usufruir das pensões de reforma a que teriam direito com base nos descontos que fazem mensalmente.
São os "mileuristas", geração encalhada na adolescência e com a idade madura comprometida.
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