2006-12-02

A SEGURANÇA SOCIAL REFORMADA, ATACA DIREITOS ADQUIRIDOS DOS PORTUGUESES

Foi aprovada na AR, com os votos de apenas um dos partidos políticos com assento na mesma, a “Reforma da Segurança Social”. Tratando-se de uma área da governação que é essencial para o futuro destas e das próximas gerações, deveria ter sido procurado um entendimento alargado entre Governo e Oposição, justificando mesmo, pela importância do seu impacte, a celebração de um pacto de regime, ao que parece, insuficientemente promovido pelo Presidente da República.
Trata-se de uma reforma de grande alcance, que afecta os direitos e os interesses de todos os cidadãos e que atravessa várias gerações. Por essa razão, é inconcebível que subsistam dúvidas sobre as sustentabilidade do sistema, no futuro, apesar da reforma aprovada unilateralmente, a qual pode apenas adiar a falência do sistema por mais 15 ou 20 anos.
Tive oportunidade de ouvir recentemente Bagão Félix em Évora apresentar, sobre este tema, a fundamentação de uma posição de crítica à reforma aprovada, demonstrando através dos seus cálculos que a minha geração já não terá direito a pensões da segurança social, para a qual desconta todos os meses, continuando ainda assim sem direito de opção pela aplicação de parte desse montante em produtos alternativos ou complementares, em consequência da teimosia e arrogância de um governo que se julga detentor da verdade, pelo facto de ser detentor de uma maioria política.
Não me surpreendeu a demonstração de Bagão Félix, apenas me convenceu em definitivo, do não retorno da situação, a partir deste ponto, dado o incontornável envelhecimento da população, o extraordinário aumento da esperança de vida e de gozo do período de pensões das gerações que agora estão a retirar-se da vida activa de forma antecipada, a ausência de mecanismos de retiro gradual da vida activa e de manutenção de actividade parcial nos primeiros anos (talvez mesmo décadas) de benefício de pensões.
Se a isso juntarmos as tendências de um mercado de trabalho que todos os meses vê crescer o número de desempregados licenciados, que passarão cada vez mais tempo à procura de empregos que já se deslocalizaram para outras regiões do globo e que, por isso, entrarão mais tarde na vida activa, em actividades desqualificadas relativamente às suas competências e habilitações, com salários mais baixos daqueles que hoje vigoram, então o quadro de sustentabilidade da segurança social agora reformada, será um perfeito desastre e uma total erosão do sistema.
A desvalorização de opiniões e propostas divergentes com o Governo, da opinião de reputados especialistas (com maior credibilidade do que os que calcularam a sustentabilidade financeira do modelo SCUT), é revelador de grande arrogância por parte do Governo. Governar exige responsabilidade na tomada de decisões e, se necessário, arrepiar caminho quando este se revela errado. Para perceber isso, a humildade é fundamental, traduzida numa atitude de audiência alargada e sem recurso a preconceitos de natureza ideológica.
A ideia de que só há uma solução e um caminho para reformar a segurança social, não faz sentido, pois o interesse nacional exigiria um debate sério, despido de demagogia política, na procura da melhor solução. O país merecia mais informação e aprofundada discussão sobre quais as medidas que contribuem para a sustentabilidade da segurança social e quais as que são políticas avulsas de saneamento financeiro as quais, sendo necessárias para reduzir a despesa pública a curto prazo (redução de pensões e de direitos), provocam no entanto perdas financeiras e sociais significativas para os futuros pensionistas, em particular para as gerações mais novas.
A solução escolhida pelo Governo apenas garante a certeza de que serão inevitáveis no futuro mais cortes de pensões combinadas com aumento de impostos, perante uma mais que previsível inevitável ruptura financeira do sistema.

Sem comentários: