2016-07-15

POEIRAS À VOLTA DO BREXIT


 
Alguma esquerda política nacional tem vindo a passar a mensagem de que o Brexit recente terá efeitos benéficos no funcionamento da União Europeia, a partir daqui. Mas, o que aí vem será melhor do que a situação atual? Conseguiremos daí colher benefícios?

Não parece que o Brexit tenha tido por móbil a ausência de solidariedade intraeuropeia e que a mesma seja intensificada a partir de agora. Também não será de esperar um aumento do respeito pela especificidade dos países do sul, podendo sim acontecer o reforço dos poderes do eixo franco-alemão em nome de uma maior coesão económica, aumentando a clivagem entre as diferentes velocidades económicas da U.E.. O núcleo dos países fundadores do projeto europeu já começou a reunir de emergência à margem dos restantes, deixando Portugal e Espanha de fora, entre outros. O centro da Europa parece tornar-se ainda mais central e distante da periferia.

Caminharemos para uma União Europeia mais forte, mais solidária e mais coesa, ou, ficaremos apenas pelos juramentos políticos de reforma das instituições europeias a par da aceleração a caminho de mais Europa? A Europa pode desequilibrar-se ainda mais a favor dos países que defendem o reforço da integração europeia sustentada em mais transferências de poder para as instâncias comunitárias e, os défices democráticos da U.E. poderão agravar-se em vez de se diluírem.

Não acredito que a crise que a U.E. vive com o Brexit resultará em mais dinheiro e mais tolerância para as contas dos países do sul. Os eleitorados dos países do centro e norte da Europa querem e exigem precisamente o contrário, mais dureza no tratamento, indiferentes à especificidade dos países mais pobres. Mostram-se recetivos a uma nova U.E. que inclua poder de veto da CE sobre os orçamentos nacionais que violem as regras e a execução das políticas orçamentais. A recuperação da soberania perdida e da subsidiariedade não se avistam pois, para já, no quadro de um aprofundamento em curso da integração económica e política da U.E.

A diminuição do compromisso europeu, o regresso dos nacionalismos e protecionismos não podem nunca ser soluções alternativas credíveis, globalmente competitivas e sustentáveis, antes tornam aquele compromisso no bode expiatório para os fracassos das políticas domésticas, incapazes (mas não impedidas) de proceder às reformas estruturais que incentivem o investimento, gerem mais crescimento económico, promovam a criação de mais e melhor emprego, diminuam o desemprego e equilibrem as contas públicas. Curioso que sejam os países do sul, que recebem mais ajudas financeiras à sua economia e há mais anos, os que mais culpam os outros pelas suas dores.

Adiarmos a consolidação das nossas contas públicas, enquanto compromisso europeu acarretará melhorias para a nossa economia e para a confiança dos nossos credores e investidores externos? Afastar-nos-á do caminho do próximo resgate financeiro, a somar aos 3 anteriores, dos quais apenas um aconteceu depois da adesão de Portugal à U.E.?

Diminuir o nosso compromisso europeu aumentará a disponibilidade dos parceiros europeus em contribuírem para um pacote de fundos mais volumoso a atribuir a Portugal neste e num próximo quadro comunitário de apoio? Teremos deixado de precisar desses fundos para modernizarmos a nossa economia e estaremos dispostos a apostar em alguma milagrosa receita socialista que nos coloque num patamar venezuelano?

A poeira esquerdista em torno do Brexit, em Portugal, tem criado a ilusão de que temos condições de escolher entre uma prosperidade autónoma e soberana e um suposto empobrecimento dependente, no seio da U.E.. Ora, a demagogia não pode toldar o nosso discernimento na escolha entre o soberano abismo dos radicais e os custos necessariamente suportáveis de um processo integrador que teremos que acompanhar na primeira linha, sob pena de não conseguirmos alcançar nenhuma das velocidades da U.E. e deixarmos de ser rebocados.

Gritemos então por Portugal primeiro, sejamos nacionalistas, soberanos, individualistas, mais comprometidos com o que se passa cá dentro, ou seja, tratemos primeiro da resolução dos nossos problemas, que apenas de nós dependem, equilibrando as nossas contas públicas, através de uma rigorosa execução orçamental. Será que é o que estamos a fazer?

Sem comentários: