2016-09-19

OS CUSTOS POLÍTICOS E ELEITORAIS DO DISCURSO REALISTA


Continua, em crescendo, a pressão sobre o líder do PSD para que altere o seu discurso, na oposição, com vista a inverter as continuadas perdas de posição nas sondagens eleitorais e a deslocação das preferências de voto para os partidos do governo, nomeadamente para o PS e BE.
Interna e externamente ao PSD, adversários e analistas elencam os riscos de Passos Coelho repetir resultados eleitorais semelhantes aos de Manuela Ferreira Leite, em 2009, quando tomou a mesma opção e proporcionou a segunda maioria a Sócrates, ao seguir a estratégia de apresentar ao eleitorado a imagem real da situação do país e os cenários negros que podem vir a traduzir as consequências económicas e financeiras negativas de uma governação socialista rendida à chantagem da esquerda radical.
O governo e os partidos da esquerda que o apoiam, desafiam o PSD a apresentar propostas concretas para o próximo Orçamento de Estado, em vez de esperar apenas pelo vaticinado afundamento da economia e das finanças do país e em consequência, por um provável novo resgate financeiro, que determinaria nova dose de austeridade, reforçada, a aplicar pela governação das forças agora na oposição. Mas, Passos Coelho repete a todos o aviso de que não vai mudar de discurso, nomeadamente nos alertas sobre os riscos das opções da atual governação, ainda que se tenha escusado, até agora, a apostar decididamente em recordar ao eleitorado as suas opções alternativas de governação e que constituem o ativo de esperança que lhe permitiria, distintivamente, valorizar a sua capacidade de evitar hoje os problemas do país que poderá vir a ter que resolver no futuro.
A recusa de substituição do discurso realista assenta assim na desvalorização das possíveis consequências do mesmo nos resultados eleitorais, caso o mesmo venha a revelar-se suficientemente preocupante e assustador aos olhos do eleitorado, que poderá não estar disponível para o aceitar, em alternativa ao otimismo exagerado, mas, tranquilizador do governo. Passos Coelho diz que salvar o país é mais importante que os resultados eleitorais, mas, a preocupação de muitos, conscientes da elevada probabilidade de concretização dos cenários previstos no discurso realista é a de que, sem ganhar eleições (agora necessariamente com uma maioria bem expressiva), não há forças políticas nem protagonistas que tenham oportunidade de salvar o país. Manuela Ferreira Leite que o diga.
O discurso realista, enquanto veículo de protesto da verdade, é sem dúvida necessário e justificado na responsabilização do eleitorado pelas opções que faz (ou de que se abstém) nas urnas, mas deve contar-se com as inúmeras vezes, tornando-se facilmente em regra, em que somos derrotados a combater o erro e a demagogia diante do eleitorado. Também não deixa de fazer sentido que o discurso realista, coerente, repetida e prolongadamente assumido sirva o propósito de afirmar uma verdade que, sabemos, conquista lentamente e não de rompante, mas, há contar com a surpreendente vitalidade da demagogia, do populismo e da ilusão, que o eleitorado alimenta, por preguiça, interesse ou anomia social e política.
Compreender o sentir da maioria do eleitorado, ou seja, das pessoas comuns, com vista a adaptar o discurso, não àquilo que querem ouvir, mas àquilo que estão preparados para ouvir, à data, tornar-se-á crucial para vencer as próximas eleições legislativas, independentemente de quando as mesmas ocorram. Alertar para os riscos que estamos a correr, continua a justificar-se, mas, sem um complemento de propostas construtivas com vista a evitar esses riscos e a vencer com mobilização e empenho os desafios daí decorrentes, constitui em si mesmo um risco não menos elevado de assustar o eleitorado com o anúncio da catástrofe. E, isso não salvará o país, porque entregará a continuidade da governação aos menos capazes, mas mais convincentes.

Os partidos políticos existem para conquistar e exercer o poder, como referiam as leis de Duverger. Não há exercício sem conquista. Não se salva o país na oposição. O PS é exímio na aplicação interna dessa lei da sociologia política, o BE e até o PCP, também já perceberam que, para mudar alguma coisa, terão que participar no sistema ou aceitar o mesmo, ainda que a contragosto.

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