2010-03-18

O PEC (Poucos Exemplos Contributivos) DO GOVERNO

Ficámos esta semana a saber que o número de desempregados inscritos nos Centros de Emprego em finais de Fevereiro subiu 92.000 num ano (+19,6%), afectando 561.315 portugueses. Se compararmos os valores relativos ao Continente, observamos que os 539.733 desempregados inscritos são superiores em 13% aos 475.602 que estavam nessa situação em Fevereiro de 2005 quando o PS ganhou as eleições legislativas, acusando o anterior governo de deixar o país à beira de uma calamidade social. Também o Alentejo, mantendo hoje os elevados níveis de desemprego de então, vê crescer em quase 50% algumas categorias de desempregados, nomeadamente os detentores de qualificações académicas mais elevadas.


Na mesma semana, fomos assistindo ao desvendar do PEC e consequentes reacções negativas da oposição, acompanhadas pelo cepticismo e resistência de ex-governantes da área socialista: Mário Soares, João Cravinho e Paulo Pedroso. O ex-ministro do Trabalho e da Solidariedade Social de António Guterres e ex-colega de governação do actual Primeiro-Ministro veio mesmo afirmar frontalmente a sua discordância da limitação imposta às prestações sociais não contributivas, por deixar de fora da atribuição do subsídio social de desemprego e do complemento solidário para idosos (que até agora era uma das bandeiras da governação socialista na área da solidariedade social) muitos carenciados que a eles têm direito.

A diminuição das despesas sociais do Estado com os mais pobres, os mais vulneráveis à crise que continuará a sentir-se ainda por vários anos, foi ainda criticada por outros especialistas como Pedro Adão e Silva, ao mesmo tempo que assistíamos à divulgação, pelo Banco de Portugal, do agravamento do crédito malparado na habitação em Janeiro deste ano, consequência da degradação da situação económica e social portuguesa e do incumprimento das empresas e das famílias.


As denúncias dos vários quadrantes parecem unânimes nas incongruências de um PEC que, para exigir esforço de tal monta aos portugueses em nome de uma responsabilidade que ultrapassa a crise e entra muito dentro da governação socialista, deveria procurar legitimação por via de uma afirmação de respeito pela justiça social e aprofundamento da equidade.
Mas a marca do PEC parece bem diferente, imposta à força por um Governo autoritário e sem qualquer noção de justiça social: o Estado vai buscar mais aos pobres do que ao adiamento das infra-estruturas e do que à nova taxa de IRS de 45%. O risco de que o aumento da austeridade, decretado desta forma, possa aumentar a pobreza em Portugal e esmagar o consumo de uma classe média para a qual se criaram centros comerciais onde cabem todos os portugueses, “gripando” por essa via o principal motor do crescimento económico (consumo privado) dos 6 anos da governação guterrista e que ainda hoje representa 2/3 da economia mas bastante pressionado pelos juros e pelo desemprego, é por demais evidente, justificando a forte crítica de que serão esta classe média e os mais pobres a repartirem o maior esforço de redução do défice financeiro do Estado.


Para lá da imoralidade que constitui o engano propositado dos eleitores sobre a real situação económica do país, promovida pelo PS antes e durante a campanha eleitoral, prometendo (pela segunda vez) tudo o que agora descarta e inverte, o agravamento da carga fiscal da classe média por via da redução das deduções e benefícios fiscais (que Sócrates repudiava ao BE em debate televisivo durante a campanha para as eleições legislativas, por constituir um aumento brutal da carga fiscal sobre a mesma classe média), constitui em si mesmo uma afronta de um Estado que perverte por completo a equidade e a justiça social.


A uma classe média já fustigada por uma pesada carga fiscal comparativamente a outros Estados-Membros da União Europeia, mais ainda se equacionadas as débeis contrapartidas do serviço público em matéria de educação e saúde, vem o Governo limitar agora em IRS as deduções de despesas a que os contribuintes recorrem na procura de soluções que não encontram num Estado ineficiente para o qual descontam tanto, prejudicando assim duplamente as famílias numa fórmula de verdadeiro assalto, o que contribui para gerar, a prazo, convulsões sociais fertilizadas num caldo de desemprego elevado a manter durante os próximos anos.


Mas não só as famílias se sentem hostilizadas pelo Governo, face a este PEC, pois das empresas também chegam sinais de idêntica desconfiança pelas medidas que o Governo procura impor na rua quando não dá sinais internos de qualquer disciplina ou rigor na gestão dos impostos que arrecada nem de melhoria significativa da eficácia e eficiência na prestação de um serviço público que se alimenta da receita fiscal. 


Alexandre Soares dos Santos, numa notável entrevista à SICN e o Presidente da CIP em momento simultâneo colocavam o dedo na ferida, ao manifestarem a esperança de que o PEC revelasse sinais claros de partilha de responsabilidades entre sectores da sociedade, para evitar a escalada da contestação social, cabendo ao Governo a exemplaridade nos cortes de gastos supérfluos (estudos para guardar na gaveta, salários milionários de gestores de empresas públicas e participadas, estruturas parasitas e repetidas em organismos autónomos da Administração Pública, …) enquanto boas práticas recuperadoras de uma autoridade moral do Estado hoje bem debilitada.
Ora, não é isso a que assistimos em matéria de exemplaridade contributiva do Governo socialista, antes pelo contrário. O que será de esperar de reacção das famílias e das empresas a este tipo de PEC?

 

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