Vamos lá então fazer as contas… certas!
Dos cerca de EUR 2300 milhões que o Governo veio dizer que custam as propostas da Oposição que foram debatidas na sexta-feira passada no Parlamento, apenas cerca de EUR 380 milhões têm francas possibilidades de ver a luz do dia.
E isto porque
- A proposta do PCP e do BE que visava dar a reforma completa, sem penalizações, a quem tenha trabalhado e descontado 40 anos (independentemente da idade) foi reprovada. De acordo com o Governo, custava EUR 960 milhões.
- A proposta do PSD de reduzir a taxa social única em 2 pontos percentuais para os empregadores em 2010 – e só em 2010 –, e cujo custo ascendia a cerca de EUR 735 milhões, foi também reprovada.
- A redução do pagamento por conta em sede de IRC, proposta pelo CDS, é um simples diferimento do momento em que o dinheiro dá entrada nos cofres públicos. Assim, se for aprovada na especialidade, terá impacto negativo em 2010 (menos receita, porque as empresas vão entregar menos imposto antecipado) – mas positivo em 2011, altura em que o IRC relativo a 2010 é liquidado. A partir daí não haverá mais impactos.
Restam, assim, a extinção do Pagamento Especial por Conta (PEC) sobre as empresas (avaliado em cerca de EUR 300 milhões) e a suspensão do Código Contributivo da Segurança Social em 2010 (cujo agravamento sobre empregadores e empregados ascenderia a cerca de EUR 80 milhões). Ah, e a extensão do prazo de concessão do subsídio de desemprego em 6 meses durante 2010 – e apenas em 2010 –, apresentada pelo PSD, que ainda não foi discutida (sê-lo-á em breve, e aposto que será aprovada), e cujo custo acenderá a cerca de EUR 120 milhões.
Juntando esta última proposta estamos, assim, a falar de cerca de EUR 500 milhões, ou cerca de 0.3% do PIB.
Não está, aqui, em causa se as medidas rejeitadas beneficiariam ou não a economia – e eu considero, em particular, que a descida da taxa social única em 2 pontos percentuais para todos os empregadores seria importante para defender o emprego no próximo ano, pelo que foi uma pena que não tivesse sido aprovada. Não. O que está em causa é a dramatização – mesmo vitimização – do Executivo perante o resultado adverso da votação de 6ª feira passada.
José Sócrates acusou a Oposição de ser “desleal” (por não apresentar estas medidas no quadro do Orçamento do Estado para 2010), e de aumentar a despesa. Desleal?... Mas as medidas apenas entrarão em vigor em 2010 – naturalmente, no quadro do Orçamento do Estado (OE)!!!... E, francamente: medidas que aumentam a despesa?!... Haja paciência!... Apenas uma, a da extensão do subsídio de desemprego em 6 meses o faz – apenas em 2010 (o que significa que, em 2011, a despesa desce pelo mesmo valor), e por um montante que nem chega a 0.1% do PIB… As outras propõem uma redução da receita, visando proporcionar alguma folga às empresas, sobretudo em 2010.
Vejamos:
- O PEC é uma espécie de colecta mínima indiscriminada, pelo que o seu fim irá beneficiar as empresas que habitualmente não pagam IRC (as outras podem abater no ano seguinte os pagamentos feitos, quando o IRC for liquidado). A sua criação visou combater a fraude e evasão fiscais, colocando todas as empresas a pagar. Os progressos feitos no sistema informático da máquina fiscal nos últimos anos deverão, em princípio, conseguir garantir o pagamento do imposto que é devido – e, assim, sendo, a maior parte da receita que não é cobrada em 2010 deverá sê-lo em 2011… beneficiando, então, os cofres públicos;
- O código contributivo será suspenso em 2010, havendo a possibilidade de esta versão – que aumenta a carga fiscal sobre empresas e trabalhadores – ou uma versão que venha a ser trabalhada, vigorarem a partir de 2011…
Uma nota ainda quando à redução dos prazos de pagamento do IVA às empresas por parte do Estado e ao pagamento de juros por parte deste quando se atrasa nos pagamentos: nada mais justo. O pagamento a tempo e horas deve ser a regra para a toda a sociedade – e o Estado não pode continuar a dar péssimos exemplos nesta matéria. Isto além de que pagar em prazos mais curtos também beneficia a tesouraria das empresas em tempo de dificuldades – e não implica despesa adicional, porque os pagamentos teriam sempre que ser feitos (apenas o prazo é antecipado)... Assim sendo, impacto nas contas públicas… só existirá, na situação absolutamente condenável, de o Estado não pagar a horas –, o que acarretará o (justo) pagamento de juros.
É, portanto, devido a 0.3% do PIB – e apenas em 2010 – que José Sócrates e Teixeira dos Santos fingiram entrar em pânico. Haja paciência e, acima de tudo, pudor, para não confundirem os portugueses. Não há nenhum aumento de despesa a partir de 2011. E impacto do lado da receita, a partir desse ano, é também negligenciável. Ora, não foi a Teixeira dos Santos que ouvimos dizer que seria a partir de 2011 que se iria preocupar em reduzir o défice público?... Será então melhor que se concentre nessa tarefa, para não repetir o rotundo fracasso do período entre 2005 e 2008, em que a consolidação orçamental do lado da despesa, tão apregoada aos 4 ventos através do PRACE, produziu ZERO de resultados. Mas essa afirmação do Ministro das Finanças significa também que ele próprio considera que, em 2010, a economia terá que ser uma prioridade – com o que concordo inteiramente!... Oxalá!...
Quanto a Sócrates, é bom que perceba que, ao contrário do que afirmou (“está para nascer o Primeiro-Ministro que faça melhor do que eu com o défice”), está é para nascer o Primeiro-Ministro que faça pior do que ele com o défice e as contas públicas em geral (e a trajectória explosiva da dívida pública? E o endividamento oculto?)…
Enfim, tudo somado, creio que estas reacções não são para levar a sério. Em minha opinião, elas decorrem, fundamentalmente, do facto de quer José Sócrates, quer Teixeira dos Santos, não estarem ainda habituados a conviver com maioria relativa. Mas, como alguém que conhecemos dizia, ainda há cerca de 4 anos e meio, “habituem-se!”: a maioria absoluta acabou-se. Ou, como dizia um antigo Primeiro-Ministro, de quem também todos nos recordamos, “é a vida!”. São os custos da democracia; há que aprender a conviver com eles. Já agora, se não for pedir muito, de forma séria. Como convém a quem comanda os destinos de um país.
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